Resumo
A replicação do DNA é um processo biológico de suprema importância, principalmente porque é o cerne da propagação de todos os organismos vivos, sendo a base da herança genética. O primeiro passo da replicação do DNA é o estabelecimento das origens, que são definidas como uma região genômica, onde a síntese de DNA inicia após a ligação de um fator de iniciação de replicação. A ligação deste fator no DNA estabelece o início da replicação através do recrutamento e ativação do replissomo. Em procariotos, um único iniciador se liga para estabelecer uma origem, enquanto que em eucariotos um complexo de reconhecimento de origem composto por seis proteínas, denominado ORC, cumpre essa função em conjunto com um fator relacionado chamado Cdc6. Os caminhos evolutivos que levaram os eucariotos a manter um iniciador composto por várias proteínas são desconhecidos, assim como os papéis desempenhados por cada subunidade ORC individual. Uma maneira de abordar isso é caracterizar funcionalmente o ORC de um eucarioto divergente, uma vez que a maioria dos estudos até o momento tem sido limitada filogeneticamente. Trypanosoma brucei, um parasito eucarioto unicelular com características genéticas peculiares, fornece um meio para enfrentar esta questão. Pesquisas baseadas em sequências não conseguiram identificar componentes ORC em T. brucei, mas abordagens bioquímicas descreveram quatro subunidades ORC possíveis (ORC1/CDC6, ORC4, Tb3120 e Tb7980). Pelo menos dois estão presentes em um complexo de alto peso molecular e todos atuam na replicação do DNA nuclear, mas cada um exibe divergência de sequência considerável das subunidades ORC dos eucariotos modelo. Além disso, outro fator de replicação similar ao ORC (ORC1B) foi identificado como um constituinte não-estático do ORC, exibindo uma localização nuclear restrita a fase S, o que sugere um possível novo modo de regulação da replicação. Essas descobertas levantam questões sobre a constituição e o modo de ação do ORC em T. brucei que podem fornecer indícios sobre sua evolução e adaptações potencialmente específicas, que por sua vez podem fornecer uma via para o futuro desenvolvimento de medicamentos antiparasitários. Assim, este projeto visa determinar a arquitetura completa do ORC em T. brucei, comparando-o às estruturas anteriormente publicadas em humanos e Drosophila sp. Para alcançar esse objetivo, realizaremos ensaios de imunoprecipitação (IP) do ORC nativa de T. brucei seguida de microscopia crio-eletrônica (cryo-EM) e análise de partículas únicas (SPEM). Como alternativa, co-expressaremos e purificaremos os conhecidos componentes do ORC de T. brucei, e novamente utilizaremos cryo-EM para descobrir como eles interagem e se podem ser comparados aos ORCs conhecidos. Podemos destacar que as técnicas de cryo-EM e SPEM aplicadas para determinar estruturas com alta resolução (<4 Â) a partir de produtos de IP é uma técnica laboriosa ainda não muito difundida no Brasil, o que torna este projeto uma excelente oportunidade para trazer essa abordagem para o meu país e aplicá-la a outros tripanosomatídeos causadores de doenças endêmicas, como por exemplo a doença de Chagas. (AU)
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