Para além da religião: os novos projetos da Universal

Resumo

O presente trabalho busca discutir a produção de corpos dóceis da Igreja Universal do Reino de Deus, por meio de diversas tecnologias de poder não consideradas, a priori, religiosas como, por exemplo: projetos de alfabetização e cursos profissionalizantes, oficinas culturais, cursos para manutenção do matrimônio, etc. Essa "engenharia de poder", que mistura mídia, política, assistência e cultura, preocupa-se com a "governamentalidade", isto é, com o governo de pessoas, por meio do poder pastoral, conceito foucaultiano para denominar o governo do cotidiano, através de uma razão pedagógica. Concomitantemente, a Igreja Universal retira de seu logo o termo "Igreja", passando a se negar como religião e busca ocupar cada vez mais espaços na organização social e na vida cotidiana, afirmando-se como cultura e reivindicando a ancestralidade hebraica mítica como sua. A organização como "cultura" implica novas práticas e possibilidades de participações na esfera pública. Nesse processo, os agentes da Universal, portadores de uma variedade de discursos apreendidos em sua trajetória de vida e formação, são obrigados a, por um lado, ordená-los de um modo a torná-los intelectivamente acessíveis a um interlocutor forjado em outro meio intelectual e/ou social e, por outro, incorporar a seus argumentos 'clichês de verdades' retirados de outros universos de conhecimento, mas, consensualmente aceitas por amplas camadas sociais tais como a importância da religião como patrimônio cultural, a necessidade do desenvolvimento sustentável, a necessidade de combate à "intolerância religiosa", a defesa do direito à "escolha livre", etc. Para tanto, categorias como "religião" e "cultura" são operacionalizadas conforme o contexto específico, ampliando a capacidade de inserção em novos projetos.