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Encruzilhadas da interpretação na umbanda

Texto completo
Autor(es):
Alice Costa Macêdo
Número total de Autores: 1
Tipo de documento: Tese de Doutorado
Imprenta: Ribeirão Preto.
Instituição: Universidade de São Paulo (USP). Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (PCARP/BC)
Data de defesa:
Membros da banca:
Jose Francisco Miguel Henriques Bairrao; Valeria Barbieri; Fabio Scorsolini Comin; Carla Guanaes Lorenzi; Luciana Fernandes Marques
Orientador: Jose Francisco Miguel Henriques Bairrao
Resumo

A umbanda caracteriza-se como um culto de possessão, cujos participantes, em transe, incorporam espíritos que se apresentam nos terreiros em cerimônias geralmente públicas a fim de trabalhar a serviço de seus fiéis e consulentes. O objetivo desta pesquisa foi investigar e descrever os processos interpretativos na umbanda, numa perspectiva etnopsicológica. Trata-se de um estudo de caso, de corte longitudinal, com base no método da escuta participante, entendida como a extensão do método psicanalítico a pesquisas de campo, mediante a utilização de técnicas etnográficas. A pesquisa de campo foi realizada no Centro de Umbanda Oxalá (Ribeirão Preto Estado de São Paulo Brasil), onde as consultas concedidas pelos espíritos incorporados pelo paide-santo foram integralmente acompanhadas mediante registros em diário de campo. Para tanto, a pesquisadora foi admitida no lugar de cambona do pai-de-santo, ou seja, um auxiliar da cerimônia. A teoria psicanalítica sobre a interpretação assumiu um valor heurístico nesta pesquisa, ao possibilitar a formulação de hipóteses de trabalho como diretrizes que permitiram ao pesquisador buscar a compreensão dos processos interpretativos na umbanda. As consultas apresentaram o uso de ingredientes-coisas-significantes que se assemelham a uma oração, mas performaticamente rezada pelo corpo, como frases que compõem um poema cuja interpretação se enuncia do próprio sistema simbólico umbandista. Sugere-se, portanto, que a interpretação neste contexto parece apresentar ricas possibilidades de combinações de recursos que se revelam para além do verbal. A psicanálise se mostrou um instrumento relevante para a pesquisa no que tange à experiência de campo, às relações transferenciais e ao refinamento da escuta. A perspectiva lacaniana foi útil na medida em que compreende que a interpretação se faz presente no acontecimento e o acontecimento inclui a sua interpretação; além de ter possibilitado a análise no registro simbólico a partir do entrecruzamento entre dois eixos, metáfora e metonímia, o que facilitou a imersão da escuta na própria linguagem dos espíritos da umbanda e, por fim, ter permitido mapear interpretações que operam na materialidade, ao pé da letra e ao pé das coisas. De outro modo, percebeu-se que o método freudiano de interpretação dos sonhos não estabeleceu aproximações com o que ocorre nos terreiros, pois na umbanda a interpretação não parece operar a partir de conteúdos manifestos para o acesso a conteúdos latentes. No caso da umbanda, a interpretação se dá em ato, ou melhor, é, em si, o próprio ato, inscreve-se no corpo, dá-se a ver, mas um ver que seja rente à pele e não restrito aos olhos. Além disso, embora tenha sido útil a ideia de que o autor da interpretação dos sonhos seja o próprio sonhador, no caso da umbanda, o sujeito intérprete não é somente o médium, o espírito, o cambono ou os consulentes. O sujeito da interpretação perpassa todos esses personagens, mas reside no próprio sistema simbólico umbandista. Desse modo, propõe-se que a espiritualidade não seja desconsiderada, mas tratada como um recurso para o desenvolvimento de novas noções de acolhimento que não somenterespeitem a cultura do outro, mas, sobretudo, incorporem-nas às suas estratégias de cuidado. Embora esta pesquisa não tenha pretendido investigar como as comunidades afrobrasileiras compreendem saúde e doença, sofrimento e cuidado, ela buscou contribuir para um entendimento de como, mediante procedimentos interpretativos, esse universo cultural refina a escuta e o acolhimento daqueles que a ele recorrem. (AU)

Processo FAPESP: 12/17036-5 - Encruzilhadas da interpretação na umbanda
Beneficiário:Alice Costa Macêdo
Modalidade de apoio: Bolsas no Brasil - Doutorado