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Prospecção metagenômica de bactérias relacionadas a quorum sensing durante a fermentação espontânea do cacau

Texto completo
Autor(es):
Otávio Guilherme Gonçalves de Almeida
Número total de Autores: 1
Tipo de documento: Tese de Doutorado
Imprenta: Ribeirão Preto.
Instituição: Universidade de São Paulo (USP). Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (PCARP/BC)
Data de defesa:
Membros da banca:
Elaine Cristina Pereira de Martinis; Leonardo Neves de Andrade; María Eugenia Guazzaroni; Luís Augusto Nero; Luiz Roberto Nunes; Diego Cunha Zied
Orientador: Elaine Cristina Pereira de Martinis
Resumo

Para obtenção de chocolate de alta qualidade é necessário que a matéria-prima, isto é, as sementes de cacau, sejam fermentadas. Os microrganismos infiltram-se após o corte dos frutos de cacau e contaminam as sementes estéreis. Como a polpa mucilaginosa é rica em nutrientes e apresenta alta atividade de água, os microrganismos encontram condições propícias para sobrevivência e multiplicação. Destacam-se as leveduras, bactérias láticas (BAL) e bactérias acéticas (BAA), que nesta ordem, realizam uma sucessão microbiana bem definida ao longo do processo fermentativo. Esse processo permite a drenagem da polpa mucilaginosa que recobre as sementes e, ao mesmo tempo, estimula as hidrolases endógenas a metabolizar os substratos de reserva armazenados nas sementes. A atividade microbiana somada à atividade metabólica interna das sementes resulta na formação de precursores característicos do sabor e aroma do chocolate. Muitos autores consideram a alimentação cruzada como o fator determinante para a sucessão microbiana, pois as leveduras despectinizam a polpa liberando açúcares que podem ser metabolizados pelas BAL, em seguida as BAL convertem os açúcares em etanol, manitol e ácido acético. O manitol é metabolizado pelas BAA como fonte de carbono, resultando em ácido acético. Embora a alimentação cruzada explique a sucessão microbiana, do ponto de vista de ecologia de comunidades, pouco se conhece sobre as interações que ocorrem ao longo do processo fermentativo, como o quorum sensing (QS), por exemplo. O QS é um processo de sincronização da expressão gênica por meio da liberação de moléculas autoindutoras em altas densidades celulares. Dessa maneira, visto que a fermentação de cacau apresenta condições para que os microrganismos atinjam altas populações e que estudos têm indicado que bactérias relacionadas ao QS podem apresentar vantagem competitiva e adaptativa a ambientes estressantes, este trabalho teve por objetivo, inicialmente, identificar por meio da metagenômica, a microbiota relacionada com QS por meio da identificação in situ do gene luxS ao longo da fermentação e em genomas de bactérias isoladas de fermentação de cacau. O gene luxS é tido como um marcador universal de QS, pois caracteriza a comunicação interespecífica célula a célula. No primeiro Capítulo deste trabalho é apresentada a análise metagenômica de uma fermentação espontânea de cacau amostrada por até 144h. Os dados obtidos revelaram que os fungos estavam presentes ao longo de todo o processo fermentativo. Além disso, demonstram também que reads relacionados ao gene luxS são enriquecidos à medida que aumenta o tempo de fermentação, atingindo um pico máximo de detecção no tempo de 72h de fermentação. Foi também observado que os gêneros Enterobacter, \"Lactobacillus\", Bacillus e Pantoea foram associados aos genes luxS, evidenciando as unidades taxonômicas operacionais relacionadas a esse gene. No segundo Capítulo é apresentado um estudo genômico comparativo no qual três cepas de Lactiplantibacillus plantarum Lb2, Limosilactobacillus fermentum Lb1 e Pediococcus acidilactici P1 isoladas de fermentação espontânea de cacau tiveram seus genomas sequenciados e comparados contra todos os genomas públicos pertencentes a essas espécies. Os resultados mostraram que o gene luxS estava presente em todas as cepas dessas espécies e que Lp. plantarum apresentava seis clusters gênicos para luxS, evidenciando um alto número de cópias. Para Lm. fermentum foram observados apenas dois clusters gênicos e em P. acidilactici um cluster gênico. Análises filogenéticas sugeriram que o segundo cluster do gene luxS (denominado luxS_2) foi transferido horizontalmente via transdução de Lp. plantarum para Lm. fermentum, visto que ambas apresentaram o mesmo cluster e a região flanqueadora desse cluster em Lm. fermentum era composta de transposases IS30. Adicionalmente, após a investigação da presença desse gene nessas espécies, primers espécie- e cladoespecíficos foram desenhados para screening rápido de cepas para avaliação do potencial relacionado ao QS e para aplicação em estudos envolvendo qRT-PCR. No terceiro Capítulo é apresentado um estudo comparativo genômico para as BAA isoladas de processo fermentativo espontâneo de cacau, cujas cepas de Acetobacter senegalensis MRS7, GYC10, GYC12, GYC19 e GYC27 (com genótipos distintos), tiveram seus genomas sequenciados e comparados com genomas publicamente disponíveis de A. senegalensis. O estudo demonstrou que em A. senegalensis não havia genes luxS, mas sim genes relacionados ao QS intraespecífico como acil homoserina lactonas (AHLs) e response regulators, bem como genes envolvidos com a inibição de QS, codificando para acilases e lactonases, o que corroborou as predições realizadas no trabalho apresentado no primeiro capítulo desta tese. Além disso, visto que as BAA apresentam potencial de aplicação em outros processos industriais, como a produção de celulose e fermentação de vinagre, vias metabólicas envolvidas na adaptação bacteriana a processos fermentativos sob condições de estresse foram também investigadas. Os dados revelaram que essas cepas apresentam um bom potencial de adaptação em ambientes estressantes, com capacidade de sintetizar chaperonas, álcool desidrogenases e proteínas ABC, que conferem tolerância a altas concentrações de etanol e a altas temperaturas. Adicionalmente, as cepas de AAB não apresentaram potencial patogênico e nem genes de resistência a antibióticos. Dessa maneira, os resultados obtidos sugerem que as cepas de A. senegalensis isoladas da fermentação espontânea de cacau podem ser aplicadas também em outros processos industriais. Por fim, no quarto Capítulo há o desfecho da tese, com a apresentação de um artigo submetido para publicação, o qual trata da detecção in situ do gene luxS em fermentações conduzidas em escala de laboratório. Dessa maneira, seis fermentações foram realizadas em duplicata, sendo denominadas F1, F2 e F3, as quais foram inoculadas com diferentes combinações de coquetéis contendo leveduras, BAL e/ou BAA, com o objetivo de comparar a expressão do gene luxS ao longo de 96h de fermentação. Para comparação, foi preparado um controle não inoculado (sem inoculação de microrganismos, sem replicata - denominada F0). Para cada uma das condições estudadas, foram realizadas análises relativas à enumeração de microrganismos, medida de pH e da temperatura de fermentação, bem como análises de metataxonômica (16S rRNA e ITS), mensuração de atividade enzimática e detecção de metabolites voláteis (VOCs) por cromatografia gasosa acoplada a espectrometria de massas (GC-MS). Os resultados foram analisados para avaliar o potencial funcional microbiano relativo a QS e à qualidade do cacau fermentado. Os resultados revelaram que ocorreu uma sucessão microbiana típica da fermentação de cacau, que foi corroborado pelas análises clássicas de enumeração de microrganismos e de metataxonômica. No entanto, estatisticamente não houve diferenças significativas nas populações microbianas enumeradas na fermentação F0 e nas demais (p > 0,05), o que também foi reforçado pela ausência de diferença significativa entre os valores de α-diversidade para as diferentes fermentações, determinada por análises metataxonômica. Não houve correlação significativamente estatística entre atividade enzimática e alterações composicionais da microbiota total, indicando que, provavelmente, a principal atividade enzimática era decorrente das próprias hidrolases endógenas das sementes e não da microbiota per se. Em relação à mensuração do gene luxS, para as espécies Lp. plantarum houve atividade ao longo da fermentação, enquanto que a expressão do gene luxS para Lm. fermentum foi detectada apenas nas primeiras 72h. A correlação entre a qualidade da fermentação expressa por meio da quantidade de VOCs detectados e o padrão de expressão dos genes luxS evidenciou uma associação positiva entre a expressão desse gene por Lp. plantarum e características sensoriais indesejáveis para as sementes fermentadas. Considerando os resultados deste trabalho, é possível afirmar que o gene luxS foi ativo ao longo da fermentação de cacau, conforme hipótese do primeiro Capítulo, e houve avanço na compreensão da dinâmica da fermentação de cacau, com demonstração da participação de diferentes enzimas ao longo do processo. Além disso, os resultados dessa pesquisa indicam que Lp. plantarum é um protagonista neste tipo de fermentação, com grande potencial de expressão de vias de QS. Futuros estudos poderão elucidar em condições de campo os dados levantados ao longo deste trabalho. (AU)

Processo FAPESP: 17/13759-6 - Prospecção metagenômica de bactérias relacionadas a quorum sensing durante a fermentação espontânea do cacau
Beneficiário:Otávio Guilherme Gonçalves de Almeida
Modalidade de apoio: Bolsas no Brasil - Doutorado Direto