Identificação de moléculas moduladoras de macrófagos a partir de veneno de aranha: novas perspectivas para o tratamento do câncer

Resumo

O câncer é uma doença multifatorial, que envolve um mecanismo complexo. Na última década, a evasão da resposta imune foi reconhecida como uma importante característica do desenvolvimento tumoral. Uma vez que o sistema imune é responsável por reconhecer e eliminar a grande maioria das células neoplásicas, o desenvolvimento de tumores sólidos ocorreria, portanto, mediante uma falha nesse sistema. Por outro lado, tem sido demonstrado que a inflamação contribui para o desenvolvimento de tumores, gerando um paradoxo acerca do papel do sistema imune no câncer. Dentre as principais células envolvidas no processo de ativação do sistema imunológico inato estão os macrófagos. Estas células têm sido classificadas nos tipos M1 e M2 (embora essa polarização seja um conceito simplista e exista, na verdade, um espectro fenotípico complexo) e apresentam uma relação complexa em relação ao prognóstico de tumores e já são descritos na literatura tratamentos utilizando imunomodulação de macrófagos, com ativação, deleção ou reprogramação dessas células. Estudos recentes do nosso grupo demonstraram que o uso do veneno da aranha Phoneutria nigriventer (PnV) levou à morte de células tumorais em modelo in vitro, além da redução ou erradicação do desenvolvimento de gliomas em tumor xenográfico desenvolvido em camundongos. Entretanto, enquanto in vitro o veneno reduziu a viabilidade celular em cerca de 20%, o volume final do tumor desenvolvido em camundongos tratados com PnV foi em torno de 90% menor do que nos animais controle (sem tratamento). Portanto, embora possivelmente esteja havendo um efeito citotóxico direto do veneno nas células tumorais implantadas em camundongo, esse efeito não justifica as proporções de redução do tumor observadas. Esses resultados levaram à hipótese de que o veneno poderia estar agindo no microambiente tumoral, contribuindo para o combate do tumor através da imunomodulação. Tendo em vista que os camundongos imunodeficientes não apresentam resposta imune adaptativa, o veneno poderia modular a resposta imune inata mediada por macrófagos. Corroborando essa hipótese, ensaios preliminares in vitro indicaram um papel modulador do veneno em macrófagos, aumentando sua atividade fagocítica, bem como a expressão de moléculas de classe II do complexo maior de histocompatibilidade (MHC II) e moléculas coestimulatórias. Portanto, o presente trabalho pretende investigar o efeito in vitro do PnV na ativação de macrófagos diferenciados a partir da medula óssea, através de uma análise fenotípica e funcional dessas células, dando início ao estudo sobre um possível papel imunomodulador do veneno. Também é nosso objetivo identificar o peptídeo isolado do veneno responsável por tais efeitos. Além disso, o presente projeto pretende solicitar uma bolsa BEPE (plano de trabalho em anexo), cujo objetivo é esclarecer os efeitos do PnV e seus peptídeos isolados em Macrófagos Associados ao Tumor (TAMs), através de colaboração com o grupo de pesquisa do Professor Mikael Karlsson, do Instituto Karolinska (Estocolmo, Suécia), que é, atualmente, referência no assunto. O trabalho contribuirá, portanto, para a elucidação de questões relevantes, que poderão resultar no desenvolvimento de uma nova terapia utilizando o peptídeo isolado do veneno como imunoadjuvante.